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sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

"Sindicatos espanhóis estão recebendo ataque sem precedentes"

Em entrevista exclusiva à Carta Maior o coordenador geral da Izquierda Unida, Cayo Lara, explica quais serão as prioridades da esquerda no novo parlamento, como acompanharão os movimentos de protesto que irromperam na sociedade civil e qual será o papel que vão desempenhar junto aos sindicatos e ao 15- M – o ativo movimento de “Indignados”, que colocou um deputado entre as fileiras da IU - para rejeitar as previsíveis medidas neoliberais que o Partido Popular colocará em prática no governo espanhol.

Oscar Guisoni - Correspondente da Carta Maior em Madri

No domingo passado, em meio à pior crise econômica das últimas décadas, a Espanha escolheu um novo governo. A contundente vitória da direita teve seu contrapeso no vertiginoso crescimento da Izquierda Unida, que passou de ter dois deputados a formar bancada própria com 11 cadeiras.

Nesta entrevista exclusiva para Carta Maior o coordenador geral do movimento e candidato a presidente do governo Cayo Lara explica quais serão as prioridades da esquerda no novo parlamento, como acompanharão os movimentos de protesto que irromperam na sociedade civil e qual será o papel que vão desempenhar junto aos sindicatos e ao 15-M – o ativo movimento de “Indignados”, que colocou um deputado entre as fileiras da IU - para rejeitar as previsíveis medidas neoliberais que o Partido Popular colocará em prática quando Mariano Rajoy assumir o governo.

- Como avalia os resultados do domingo passado? A que se deve fundamentalmente o sucesso obtido pela Izquierda Unida, que conta novamente com bancada no Parlamento nacional?

Os resultados têm um importante aspecto negativo e acontece que o Partido Popular, que representa a direita, obteve a maioria absoluta, o que lhe dá a possibilidade de aplicar as políticas neoliberais que o FMI e a Comissão Européia recomendam. Mas deve-se considerar que o Partido Socialista já tinha sido um fiel escudeiro para estas políticas e tinha se submetido a todas as exigências dos mercados.

A Izquierda Unida teve um grande sucesso ao passar de 2 para 11 deputados, apesar de uma Lei Eleitoral injusta que faz com que um deputado eleito nas listas da IU precise 2,5 vezes o número de votos que os deputados da maior parte das restantes formações. Mas a IU fez uma análise séria da crise, explicou as conseqüências das políticas neoliberais, divulgou uma alternativa de solução baseada em políticas de criação de emprego e estímulo da economia e, sobretudo, esteve presente em todas as mobilizações em defensa do emprego, da moradia, dos serviços sociais e prestou atenção às demandas do movimento dos “indignados”.

- Estão tranqüilos com estes resultados ou esperavam colher mais votos descontentes entre as fileiras socialistas?

Os resultados responderam aos objetivos que tínhamos planejado e todos eles foram atingidos. Essencialmente era ter grupo próprio no Congresso e que esse grupo fosse numeroso. Éramos conscientes das dificuldades propostas pela Lei Eleitoral, que o PSOE se negou a modificar apesar de que abria a porta para a maioria absoluta da direita.

Houve uma importante migração de votos do Partido Socialista e também um interessante respaldo entre os jovens que votavam pela primeira vez. Mas era previsível que muitos eleitores decepcionados se refugiassem na abstenção. O PP apenas aumentou seu respaldo em pouco mais de 500.000 votos.

- Alguns meios de comunicação insinuaram que a IU não tirou mais votos do PSOE porque os votantes socialistas não gostam que a IU diga que o PSOE e o PP são a mesma coisa. Você acha que isto é assim mesmo ou pensa que se interpelou corretamente aos votantes de esquerda nestas eleições?

A Izquierda Unida não disse que o PP e o PSOE são a mesma coisa, mas que fizeram as mesmas políticas, especialmente as políticas econômicas e sua coincidência no modelo de saída da crise. Precisamente uma das diferenças que existem entre o PP e o PSOE, sem dúvida a mais importante, é que suas bases sociais e eleitorais são muito diferentes. Com esse critério nos dirigimos ao eleitorado decepcionado do PSOE e acredito que obtivemos um resultado satisfatório, apesar de que a direção do PSOE e os meios de comunicação que são seus aliados tentaram abrir uma trincheira com argumentos pouco políticos e nada programáticos para evitar a migração de votos.

- Que passos a IU seguirá nos próximos meses, levando em conta que é muito provável que o PP coloque em prática um severo programa de ajuste que trará consigo uma forte resposta social? Como pensam acompanhar este processo?

Nós vamos propor uma oposição aguda às políticas neoliberais e a qualquer decisão que signifique ajustes e recortes. Vamos fazê-lo no Parlamento e também na rua, com os sindicatos e os movimentos sociais.

- Nos últimos tempos surgiram na Espanha diversos movimentos cidadãos que se opõem a diferentes situações resultadas da crise. Desde os que estão contra os despejos bancários até os que pedem maior participação com uma lei eleitoral diferente. Qual será a estratégia da IU para acompanhar estes movimentos no seu novo papel no Parlamento nacional?

Muitas destas reivindicações são antigas para a Izquierda Unida e constituíram uma parte importante do nosso trabalho nas instituições representativas. No futuro, com maior força, seremos uma autêntica ponte para levar ao Parlamento o que as ruas estão demandando.

- Diferente de outras ocasiões, o PSOE aparece neste momento muito debilitado pelo que aconteceu, até o ponto de perder a sua identidade de esquerda perante suas bases. Você acha que este é um fenômeno conjuntural ou é provável que o Partido Socialista tenha entrado em um profundo declínio do qual terá muita dificuldade para sair?

Eu acho que não é um problema conjuntural e que o PSOE deverá fazer uma reflexão muito profunda sobre o papel que desempenhou e que deve desempenhar perante a crise do sistema. Mas nós respeitamos esse debate e não queremos imiscuir-nos nele.

- Que alternativas econômicas a IU irá propor no parlamento para sair da crise atual?

Serão as mesmas que propusemos aos eleitores na campanha. Políticas de estímulo para criar emprego e para incentivar a economia real. Isto, que representa um aumento do gasto público e do investimento, não deve ser trasladado ao aumento do déficit e da dívida. Portanto, é necessária uma reforma fiscal justa e uma luta séria contra a economia clandestina e o fraude.

De imediato, devem ser tomadas medidas para frear a perda de emprego, proteger os trabalhadores e trabalhadoras desempregados, e parar com os despejos de sua moradia dos desocupados que não podem pagar a sua hipoteca.

- De que forma a IU se relacionará a partir de agora com o movimento "15-M"?

Vamos manter o mesmo tipo de relações que mantivemos até agora. Respeito mútuo e apoio as suas reivindicações. Algumas das pessoas ativas no movimento fizeram parte das candidaturas da IU e uma delas foi eleita deputado.

- O que você acha que a IU deveria fazer agora para se instalar, visando às próximas eleições, como uma verdadeira alternativa de poder?

Traçamos um objetivo estratégico muito claro: trabalhar para obter a hegemonia no seio dos trabalhadores, dos setores populares e da esquerda. Fundamentalmente se trata de uma hegemonia no campo das idéias, que deverá ter a sua tradução no terreno da política e dos resultados eleitorais.

- Você acha que é necessário reformar a lei eleitoral? Por que motivos e através de que estratégias a IU se propõe instalar na sociedade a necessidade desta reforma?

Certamente deve ser feita uma reforma profunda na Lei em duas direções. A primeira é que cada voto tenha o mesmo valor de representatividade institucional, isto é que cada deputado seja obtido com um número de deputados equivalente. A segunda, que se habilitem medidas mais eficazes de participação e consulta direta aos cidadãos: orçamentos participativos, consultas em referendos vinculantes das questões transcendentais, etc.

- Esta crise evidenciou que a Alemanha e a França são os que têm as rédeas na Europa e atuam como representantes dos grandes capitais financeiros que estão lucrando com a especulação em torno da dívida soberana. É possível uma alternativa política neste contexto que não implique em abandonar a União Européia ou se enfrentar diretamente com os países mais poderosos do continente?

É possível, mas para isso deve haver uma mudança na correlação de forças na Europa. Nisso há uma grande ajuda: nenhuma das medidas adotadas até agora pelo neoliberalismo está obtendo resultados. Objetivamente falando, construir a Europa já é construir outra Europa porque esta não é viável.

- Que papel você acha que os sindicatos desempenharão na hora de se opor às próximas medidas de ajuste e como a IU acompanhará esse processo?

Os sindicatos de classe estão recebendo um ataque sem precedentes da direita e de seus meios de comunicação. A Izquierda Unida irá defender os sindicatos como um baluarte imprescindível na defesa dos interesses dos trabalhadores e irá exigir o respeito ao seu papel fundamental estabelecido na Constituição. Desde já, vamos apoiar a tramitação da Iniciativa Legislativa Popular apresentada contra a reforma trabalhista aprovada pelo governo anterior.
FONTE: http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=19035

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