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quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Os tipos Populares do Ceará Moleque: Bembém Garapeiro, Manezinho do Bispo e Raimundo Varão


O epíteto Ceará Moleque foi incorporado ao imaginário cearense e designa as presepadas de um povo gaiato que vaiou o Sol, transformou um bode chamado Yoiô em peça museológica e é capaz de rir da própria miséria. A molecagem do cearense é expressa na oralidade do povo mas também possui registro escrito nos clássicos “Coisas que o tempo levou” de Raimundo Menezes , “Fortaleza Belle Epoque” de Sebastião Rogério Ponte ,“Sábado – Estação de Viver” do Juarez Leitão ou ainda o saudoso Blanchard Girão que antes de partir nos brindou com seu livro "O Liceu e o Bonde - Na Paisagem Sentimental da Fortaleza-Província".
 O termo “Ceará Moleque” surgiu com o escritor Adolfo Caminha no romance “A Normalista”, obra naturalista do século XIX que desnuda a Fortaleza das irreverências e ironias mas também dos preconceitos e da hipocrisias, do qual o próprio autor foi vitimado. A Praça do Ferreira era a capital da república do Ceará moleque. Era lá que a pilhéria e a compulsão a molecagem encontrava seus maiores representantes nos tipos populares originados das camadas mais pobres ou ainda na boemia literária, escritores e poetas, oriundos da classe média. Segundo o poeta Plautus Cunha, filho do genial Quintino Cunha, todo cearense carrega o estigma da molecagem pois , “o moleque do Ceará, manifesta-se repentinamente em qualquer cearense, e neste momento não há preocupação de classe ou posição social; desembargadores, militares, políticos, eclesiásticos, comerciantes, caixeiros, gente de rua, zé-povinho, respeitosas, engraxates, mães de família, mocinhas, todos enfim, que nasceram no Ceará, guardam em si uma molecagenzinha para disparar quando menos se espera.”
 Mas afinal, quem eram esses tipos que fizeram rir os nossos conterrâneos? Quem foram aqueles poetas e loucos que nos fizeram refletir sobre a cearensidade? Será que a propensão ao deboche não refletia , na verdade , um preconceito das elites contra os tipos populares? Havia o Bembém Garapeiro, proprietário de um quisque que vendia caldo de cana defronte ao Passeio Público. Garapeiro era fascinado com os hábitos franceses da elite Fortalezence que imitava Paris. Com muito sacrifício, juntou dinheiro e realizou o sonho de conhecer a capital da França. Voltou impressionado e dizia que lá até as crianças, prostitutas e garis falavam francês. Aculturado, agora queria ser chamado de Bién-Bién Garapiére.
 Outro tipo inesquecível foi o Manezinho do Bispo, porteiro do palácio católico, que tempos depois virou sede do poder executivo municipal. Pois bem, Manezinho era um tipo esquisito. Usava um surrado paletó cinzento bem menor do que seu corpo comportava, deixando amplamente à mostra o punhos brancos da camisa O cabelo, ensebado e liso era muito branco. Se pretendia escritor e carregava sempre um rolo de papel com seus escritos, poemas, pensamentos e aforismas.
Do seu talento surgiram pérolas como “amar sem ser amado é correr atrás de um trem e perder”, “O bacharel pobre que casa com uma moça pobre dá um tiro com pistola do passado nos miolos do futuro”, “gostaria de ser como as borboletas: as borboletas voam e eu não vôo”ou então o poema dedicado a sua falecida genitora: “Para minha ex-mãe”. Manezinho acordava de madrugada e escrevia poemas aforismas que lhe pareciam geniais mas que eram motivos de risos na Praça do Ferreira.
Um dos seus clássicos foi o poema dedicado ao Brasil: “ Minha Pátria, Minha Pátria/ Querida terra brasileira, / Por ti dou eu / Uma grande carreira.” Outro tipo engraçado foi Raimundo Varão, poeta que tinha seis dedos em cada mão e possuía um um sapo como animal de estimação. Os antigos diziam que Raimundo Varão tinha parte com o diabo. Uma histórias de Varão corroborou para esta a a lenda desta mefistofélica parceria: Certa noite boêmia, o poeta terminou a farra na Praia Formosa em meio a uma tempestade com raios e trovões. Raimundo Varão não se intimidou e berrava ensadecido aos céus que Deus provasse a sua existência mandando um raio que o partisse ao meio.
 O cearense moleque revela no espelho da sua gaiatice seu corpo e alma que desafia o tempo no palco da vida. Destas paragens merece destaque a história do Bode Yoiô e uma certa padaria, comandada pelo padeiro Antônio ( Moacir Jurema) que alimentava com o pão o espírito inquiento do cearense. Mas aí já vão outras histórias.
. FONTE: http://www.evaldolima.com.br/2011/12/os-tipos-populares-do-ceara-moleque.html

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